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  16/10/2022  •  Sociedade  •  415 hits  •  0 comentários ⇣

Pena capital - isso realmente vale a pena?

Meu entendimento sobre a pena de morte já foi bem diferente do que é atualmente. Depois de muitos anos, repensei. Hoje, sou radicalmente contra sua institucionalização, entendendo que essa é uma sentença de caráter definitivo em que não se pode cogitar, sob hipótese alguma, qualquer possibilidade de erro. 


Mas um assunto complexo como esse suscita muita reflexão e gera, igualmente, polêmica, comoção e melindre no seu tratar. Mexe com nossos valores (que em certos momentos se contrapõem) e com nossas nocões de respeito e de direito à vida, dois temas extremamente caros para nós, independentemente de que lado ideológico a gente esteja. 


Por isso, a despeito da opinião que você já tenha, sugiro que leia o texto abaixo e reflita comigo sobre os detalhes que permeiam esse tema tão polêmico. 


Na história


A pena capital (como também é conhecida devido ao fato de que, antigamente, as pessoas eram decapitadas, ou seja, tinham a capita [cabeça, em latim] arrancada após a condenação) já foi utilizada por diversos locais no mundo inteiro como forma de justiçamento e por diversos motivos, tais como assassinato, estupro, apostasia, sodomia, tráfico de pessoas, de drogas e corrupção política, dentre diversos outros e variando de época para época e de país para país - mas sempre aplicada sob a autoridade do Estado e nunca pelo cidadão comum (nesse caso, a morte intencional causada por este último seria entendida apenas como assassinato e não como pena). 


Mas, a despeito das transformações sociais que a humanidade vem sofrendo, a poena capiti ainda é utilizada em muitos países como uma "solução" quando se trata de castigar aqueles que cometeram crimes "imperdoáveis". Ao todo, são 54 países (1) no mundo que a mantêm oficialmente (dentre eles, China - considerado o país recordista (2), Estados Unidos, alguns países do Oriente Médio, vários na África e diversos outros ao redor do planeta - ainda que, em alguns deles, esta pena já não seja aplicada há mais de dez anos). A tendência desses países, no entanto, é seguir em direção ao abolicionismo e eliminar de vez esse tipo de punição para aplicar alguma outra alternativa "mais humana" (para crimes graves ou contra a vida) como a prisão perpétua. 


É bom esclarecer que existe uma diferença entre pena e execução. Pena, juridicamente falando, é uma sanção determinada pelo Estado imposta ao criminoso, enquanto que, execução é a aplicação da pena após proferida a sentença, sendo que, o fato da imputação da pena não garante seu cumprimento. 


Aqui no Brasil, a última aplicação (com execução) que se tem notícia ocorrida oficialmente foi a do escravo Franciso, em 28 de abril de 1876. Ela (a pena) foi instituída no País com o propósito primeiro de amedrontar os escravos e, após a abolição da escravatura em 1888 e a posterior proclamação da República em 1889, perdeu seu fim. Mais tarde, em 1969, quando já vigorava o regime militar (ou ditadura militar - 1964 a 1985), foi instaurado o Ato Institucional nº 14 (AI-14) que trazia de volta a pena capital, mas somente para crimes de guerra. Desconsiderando os mais de 400 mortos/desaparecidos durante o período (e que foram vítimas dos mais diversos e absurdos métodos de tortura), houve apenas uma única condenação oficial, porém, sem que fosse consumada a execução. 



Posições conflitantes


Segundo última pesquisa do IPEC (set/2022), no Brasil, aproximadamente 42% da população aprova sua institucionalização, enquanto que 49% desaprovam. Esse índice de aprovação já alcançou um valor maior: em 2018, aproximadamente 57% dos brasileiros era a favor enquanto que 39% seriam contra. Estranho que em 4 anos isso tenha se invertido mas são os dados que são divulgados. Contudo, se a gente avaliar as pesquisas feitas desde 1991, vai perceber que ficamos variando numa corda bamba em relação à parte da população que é contra e a parte que é a favor. 


Entre motivos emocionais e racionais, segue uma lista abaixo que exemplifica mais ou menos  como pensa cada lado. 


 A favor: 
• A consciência sobre a pena de morte leva o criminoso a se inibir e evitar matar. 
• Economiza-se dinheiro público, já que não é necessário sustentar o criminoso na cadeia. 
• Eliminar o criminoso impede que ele subverta outros presos e ainda libera espaço nos presídios. 
• O criminoso não pode voltar a cometer crimes depois de morto. 


Contra:
• A institucionalização da pena não inibe o bandido a ponto de impedí-lo de cometer o crime. 
• O custo para se manter um preso no corredor da morte é muito elevado. 
• A maior parte dos condenados é formada por pessoas de baixa renda. 
• Não está provado que instaurando a pena de morte os crimes diminuam. 


Dá para se perceber como alguns argumentos, praticamente, se anulam, porém, cada um que defende sua crença, se enxerga dentro de sua razão. 



Questionando


A bem da verdade, (estando bem de saúde) ninguém quer perder a vida. Aliás, as criaturas nascem para estar vivas e, se não fosse assim, ser vivo não faria sentido. Natural, portanto, que a gente não simpatize com quem ameaça anular nossa existência. Até aí, nada de errado, pois... Queremos viver!  


Só que a possibilidade de perder esse direito nos coloca numa posição de alerta, afinal, ninguém sabe o que pode acontecer no próximo minuto. Ninguém gosta de ser morto - o que inclui o assassino -, portanto, todo mundo espera permanecer vivo até quando sua genética lhe permitir. Assim são os animais (sem muita consciência sobre isso), assim somos nós (com toda a nossa consciência). Daí ser possível entender porque milhões hoje no Brasil são simpatizamtes da irreversível pena capital. 


Mas para uma parte da população brasileira, pessoas que se envolvem com o crime têm sempre por trás desse envolvimento uma motivação social que as conduz (ou que as obriga). Não é uma visão geral, mas supõe-se que essa motivação (pouca educação, fome, sentimento de injustiça, discriminação, etc) é um fator preponderante para que o indivíduo, supostamente pacífico, seja subvertido e cometa algum tipo de delito. Concordo que, até certo ponto, isso faz sentido, afinal, nem todo mundo tem capacidades iguais de assimilar bem as mesmas coisas e de tomar as mesmas decisões. Nem todos se resolvem da mesma maneira. 


Mas não parece correta a ideia de negar nesse indivíduo a capacidade de compreender coisas tão simples, como, por exemplo, o direito à vida. E, ao contrário do que se pensa, não é necessário acesso à educação formal para se assimilar valores. Aqui no Brasil, até o final do século XIX, 80% da população, aproximadamente, era analfabeta. Não dá para imaginar milhões de pessoas se digladiando e se matando porque não sabiam nem ler nem escrever e, portanto, teriam dificuldade em coexistir (e o resto da humanidade, então, não chegaria nem aos dias atuais). E, de fato, não foi isso o que aconteceu.  


Dentro de uma sociedade estruturada, com comunicação verbal e rodeada de tecnologia - como acontece atualmente -, de uma forma ou de outra e de maneira diversificada, as pessoas se informam. E é fato que a educação formal ajuda (às vezes, até bastante), mas os negacionistas contemporâneos (como os antivax e os terraplanistas), contudo, são exemplo de como a formação escolar, por si só, nem sempre é capaz de conduzir alguém a um caminho positivo. Estes, são, geralmente, cidadãos de classe média e que estudaram, pelo menos, até o segundo grau mas que acreditam, contudo, apenas numa verdade criada dentro de seu próprio mundo imaginário. E, a despeito de terem possibilidade de acesso às mesmas informações de mídia que eu e você, por decisão pessoal, as rejeitam jurando estarem no rumo certo. 


Acreditar, portanto, que a parte da sociedade que é mais desprivilegiada economicamente não consegue compreender o que é compaixão, respeito, dor do outro, altruísmo, tolerância, dentre outras coisas - porque é pouco ou nada alfabetizada -, é uma conclusão superficial e, porque não dizer, preconceituosa. É como insinuar que nós da classe média somos superiores porque tivemos mais acesso à educação formal e à cultura, portanto, podemos discernir melhor sobre todas as coisas e temos, também, a capacidade de nutrir sentimentos nobres pelos nossos semelhantes, enquanto que pessoas da classe baixa, não. 


Assim, não faz sentido padronizar e colocar como passíveis de delito os indivíduos das classes mais pobres porque, ao contrário da classe média, tiveram pouco (ou não tiveram) acesso à educação básica - ou, ainda, porque passam por carências como, por exemplo, a insegurança alimentar (que hoje bate à porta de uns 30 milhões de brasileiros). Não é fácil viver com privações desse tipo mas, imagine toda essa gente assaltando por aí. O pobre, por si só, não é bandido. 



Mas o que te importa?


O que importa para você que lê esse texto?
Sua profissão? Sua imagem pública? Seu aspecto físico? Seus filhos? Seus projetos de vida? As causas pelas quais você luta? O bem-estar social? Sua coleção de tampinhas? 
Só você pode dizer para você mesmo o que lhe é importante mas, com certeza, não será igual para outros milhões de pessoas - que, inclusive, podem ter tido acesso a conhecimento e  experiências de vida semelhantes. 


Na verdade, para cada um de nós, importam várias coisas. Estas fazem diferença e dão sentido ou segurança à nossa existência como, por exemplo, fazer algum trabalho voluntário, poupar para garantir a aposentadoria, ir a uma passeata ou a um culto espiritual ou até estudar para mudar de profissão. Tudo isso confere à vida um significado pessoal e intransferível - além do valor natural que ela já tem. 


Mas nesse montão de coisas, as profissões, em particular, assumem um papel relevante porque, para quem tem o privilégio de escolher, elas representam um reflexo de nosso perfil e expectativas e, ao mesmo tempo, uma possibilidade de sobrevivência acompanhada de um certo prazer. 


E enquanto alguns preferem ganhar a vida em profissões mais comuns como trabalhar em alguma área administrativa numa sala com ar-condicionado, outros, dentro de sua liberdade de decisão, preferem atividades mais arriscadas como ser policial, piloto de avião ou instrutor de asa delta. E outros, por questão de necessidade, são obrigados a decidir entre uma atividade ou outra - por mais que essa atividade não coincida com suas preferências. Mas até para pessoas sem renda ainda é possível dizer que lhes é facultada alguma possibilidade de escolha pois há aquelas que preferem pedir ao invés de roubar (que são as pessoas em situação de rua - ou mendigos, no popular). 


E, finalmente, há as que não querem ser pedintes e que entram no mundo do crime por não conseguir vislumbrar para si qualquer possibilidade de sobrevivência que seja honesta, pois, como falei lá em cima, nem todo mundo consegue se resolver bem com todas as coisas. 


Mas o que se opõe e desconstrói a ideia de que as circunstâncias sociais são sempre o fator que leva as pessoas à criminalidade é a constatação de que uma parte dos criminosos são originários das classes média e rica (e não somente das classes baixas). E nessa condição não há como afirmar que o comportamento destes seja fruto de desajuste social. São pessoas que não passam necessidade e que escolheram o caminho da contravenção por sua própria iniciativa, portanto, indubitavelmente capazes de assumir a responsabilidade sobre seus atos. Estas, simplesmente, preferem não fazer nada que seja honesto (profissionalmente falando) e que lhes faça gastar tempo e esforço físico além do que aceitam tolerar e, isso, por pura decisão pessoal. Para estas, não importa o que podem oferecer à sociedade mas, sim, o que irão usufruir dela. 


Assim, executar ações que prejudicam outros seres humanos como falsificar documentos ou desviar verbas públicas, por exemplo, não é necessariamente algo motivado por problemas sociais, inclusive porque estas podem se enquadrar nos chamados "crimes do colarinho branco" (que também podem envolver falsificação de provas, chantagem, compra de votos, fraude em licitações e eliminação de adversários, dentre outros). Para não falar dos ultra modernos crimes cibernéticos (crackerismo, pishing, clonagem de cartões, fraudes financeiras, etc). E, finalmente, dos crimes de preconceito como racismo, machismo e homofobia - que em algumas circunstâncias culminam até com a morte do discriminado.  


Não é possível aceitar que as pessoas, com toda a sua inteligência, não sejam capazes de entender o dano que causam aos semelhantes quando cometem algum tipo de delito (e se elas mesmas não compreenderiam a gravidade se fossem vítimas do mesmo delito que cometem). Importante, por isso, entender que o crime não escolhe, obrigatoriamente, nem tipo e nem autor por classe social. 


E, para finalizar, mesmo que variem as suas noções do que é certo e do que é errado (e desconsiderando aqueles com problemas cognitivos), humanos são sim capazes de compreender o mal que causam ao outro. Cabe, porém, perguntar o quanto, para cada um, isso importa. 



Mas o que pensa um criminoso?


Entre os séculos XIX e XX foram desenvolvidas algumas teorias que procuravam entender e classificar crimes e criminosos (período em que surgiu a ciência conhecida como Criminologia) e que tinham como principais autores Cesare Lombroso, Enrico Ferri e Rafael Garófalo. Estas classificações eram baseadas no perfil biopsicológico do criminoso, no modus-operandi e na gravidade dos crimes praticados. 


Na classificação de Lombroso figuravam quatro tipos de criminosos: o nato, o louco, o ocasional e o passional. Depois, estas classificações foram se sofisticando mais com a revisão de outros autores e, mais tarde, passaram a ser contestadas - e, a bem da verdade, soavam um pouco pretensiosas.  


Mas, desconsiderando os criminosos com problemas mentais/psicológicos evidentes e todo o preciosismo que envolvia essas classificações, dá para simplificar essas listas, e manter, basicamente, dois tipos principais: os criminosos habituais e os criminosos ocasionais. Os habituais seriam os que fazem da contravenção um meio de sobrevivência (assaltantes, fraudadores do serviço público, criminosos virtuais, traficantes...), enquanto que os ocasionais seriam os que se envolvem no crime raramente ou apenas uma vez como os discriminadores ou assassinos de alguém (de mulheres, negros, homossexuais, etc) ou aqueles que participam de alguma fraude na empresa ou serviço público mas que não fazem disso uma praxe. 


Todos estes são indivíduos com uma noção boa (senão perfeita) de que sua prática é socialmente reprovável, tanto que, no caso dos habituais, na medida do possível, se protegem sob o manto do anonimato. Mas mesmo os que não têm como se esconder entendem que, quando furtam seu celular na rua ou quando matam a namorada por suspeita de traição, estão praticando um delito que pode resultar em uma represália mais dura como agressão física, prisão e até linchamento. 


Vale ressaltar também que, não somos santos e muito menos perfeitos. Somos passíveis de cometer erros - isso é inegável. Mas mesmo com a noção de crime variando de época para época e de local para local (o crime de homofobia, por exemplo, passou a ser lei desde 2019 no Brasil, enquanto que em diversos países da África o crime ainda é ser gay), entendemos que determinados erros que cometemos (ou que possamos vir a cometer), a partir de certo ponto, saem da condição de simples erro para entrar na condição de delito (ou crime). Mas qual o grau de importância que se dá para isso? 


O criminoso, então, é um sujeito como nós, com suas necessidades fisiológicas, com seus desejos de consumo, com sua inteligência, com algum tipo de qualidade, com sua percepção moral, com sua visão de mundo, com seus defeitos e com sua capacidade de cometer erros. Ele, inclusive, pode estar em nossa família, em nossa roda de amigos, em nosso trabalho ou em qualquer outro lugar, não sendo, portanto, nenhum ser anormal. 


Entender que o criminoso tem capacidades similares às nossas é importante para que a gente aceite que quando falamos em sua recuperação, falamos na transformação de suas crenças e visões, portanto, na transformação de sua personalidade segundo nossas convicções. Só que quando fazemos isso, estamos tentando violar um de seus direitos mais básicos que é o direito à sua individualidade. 


Difícil aceitar isso, correto? Pois é, mas imagine a seguinte situação: eu, que escrevo este texto, sou vegetariano por ser simpatizante de Direito Animal. Acho isso elevado porque é uma maneira de permitir que outros seres diferentes de nós vivam sua vida até o fim. Eu faço o "sacrifício" de não comê-los e acho que os outros também poderiam fazer. Mas se você estudasse sobre o assunto concordaria também em ser vegetariano? Se você não se identifica com a causa, provavelmente, arranjaria algum argumento para justificar sua recusa por mais que estivesse informado, certo? Não estou recriminando sua postura, apenas mostrando que nossa capacidade de compaixão pode não ser tão grande quanto imaginamos e, obrigatoriamente, vai ser diferente para cada indivíduo. Ninguém se importa com as mesmas coisas da mesma maneira simplesmente porque teve contato com os mesmos conhecimentos relativos a elas. 


E como acontece conosco, acontece também com o transgressor. Faz parte de sua visão de vida aceitar a possibilidade de cometer um crime. Para nós, não (salvo em casos extremos como de legítima defesa). Então, por que ele se sentiria errado apenas porque pensa diferente de nós? Para ele, não faz sentido achar que deve ser transformado a ponto de pensar e se portar da forma como nós (e não como ele) achamos conveniente.


O fato de eu concordar comigo mesmo (o que é óbvio), não é prova para você que o que eu penso seja uma verdade. 



Finalizando


O texto acima não foi construído para tentar demonizar o criminoso, mas, antes de tudo, uma tentativa de não santificá-lo, visto que, este passa por situações similares à de muita gente (por mais diversas que sejam) mas acaba por seguir um caminho diferente da maioria - ainda que, como já falei, não sejamos santos e possamos errar em alguns momentos de nossa vida. 


Dá para se entender, contudo, que o transgressor tem nuances - assim como todo mundo - e que uma parte deles (os menos perigosos) pode sim ser "recuperada" dependendo do trabalho que se faça e de sua própria disposição (ou seja, se ele mesmo concordar com a mudança, caso contrário, não haverá recuperação). 


Mas é importante, também, considerar o lado da vítima. Colocar o transgressor como resultado de uma conjuntura social e esquecer o lado de quem perdeu seus pertences, sua integridade física ou até a vida, acaba sendo um tanto desumano, principalmente, se considerarmos que a vitima do crime, por tabela, acaba sendo vítima dessa mesma conjuntura. 


E se a gente traz isso para o contexto da discriminação vai entender que o gay, a mulher, o índio, o mendigo e o religioso, dentre outros, não podem ser constrangidos sem motivo e muito menos mortos como se isso fosse uma coisa trivial - como, por exemplo, no caso do índio Galdino, ou dos recentes George Floyd e Genivaldo. Se a gente defende os direitos das pessoas desses grupos - ou de quem quer que seja - tem que se lembrar que elas só podem usufruir desses direitos enquanto estiverem vivas. 


É necessário lembrar também que a despeito de a noção entre o certo e o errado variar de pessoa a pessoa, cada um sempre fará o que lhe é certo naquele momento, por mais que ela possa se arrepender depois. O depois, inclusive, é uma outra situação: não vale matar alguém por motivo fútil, por exemplo e, após o crime dizer simplesmente que se arrependeu. Além de isso nem sempre ser verdadeiro, não traz de volta a vida do assassinado. 


Por essas coisas é compreensível o rancor e o desejo de parte da população em querer eliminar o criminoso do convívio social pois ele não é uma pessoa anormal e, como nós, tem convicções das quais difcilmente vai querer se desfazer.


Mas a gente tem que ir com calma. 



NÃO À PENA DE MORTE
 


Os EUA são um dos países que mais fornecem estatísticas sobre pena de morte no mundo (3), inclusive porque é um dos que mais executam. Mas enquanto pesquisas afirmam que não existe relação com pena de morte e diminuição da criminalidade, outras sugerem que sim. Mais correto seria a gente confiar nelas (as pesquisas), mas, em virtude da imprecisão da resposta, arrisco minha opinião:
1 -  Não acredito que faça sentido para um criminoso habitual ficar levando em consideração a punição que pode sofrer (por mais que esteja informado) em virtude do delito que poderá cometer. Normalmente, para um crime premeditado, a crença é a de que ele (o crime) vai dar certo, portanto não haverá punição.
2 - Já para um crime movido por impulso, não há muito tempo para avaliação de consequências (mesmo com uma consciência prévia sobre elas). Em um momento em que a adrenalina é "ligeiramente" mais intensa que num passeio de canoa, é natural que a estabilidade emocional do indivíduo esteja prejudicada e também a sua capacidade de reflexão, portanto, para quem está prestes a se tornar criminoso, a possibilidade das penas que poderá sofrer não será, naquele momento, uma realidade. 


Mas e o que diríamos do cidadão comum, aquele que possui porte de arma, por exemplo? Achamos que o cidadão armado vai estar muito mais tranquilo sabendo que pode se proteger do bandido e preservar sua vida, mas nunca se sabe como será o momento da abordagem do criminoso e como ficará o estado emocional do abordado naquele instante. Com certeza não estará com a mesma calma com que você lê este texto agora. Este mesmo cidadão, num momento de azar, poderá perder sua vida ao tentar reagir ou, com sorte, poderá eliminar o bandido - contudo, nesta reação, ele estaria com a razão (protegido pela legítima defesa). Mas, em outra situação, numa discussão com um cidadão qualquer na rua, pode se precipitar e eliminar a vida do oponente se tornando ele mesmo o criminoso. Nesse caso, que punição mereceria o indivíduo que tinha o porte de arma apenas para se proteger e acabou eliminando alguém sem um motivo justificável? 


Bom, e quem já pesquisou sobre o filósofo Kant (4) deve ter percebido que sua opinião sobre o criminoso em geral é similar à minha. O que eu discordo, contudo, é de sua teoria para puní-lo (o retributivismo). Para Immanuel Kant a pena para um transgressor da lei, além do caráter essencialmente punitivo, deveria ser retribuída de forma similar (e na mesma medida) à do delito cometido, ou seja, no olho por olho. Imagine se agora, em acordo com Kant, tivéssemos que aplicar a pena capital a esse mesmo cidadão (do exemplo acima) que, num impulso, matou outra pessoa numa discussão de bar ou de trânsito - sendo que ele mesmo teria a consciência de que não representa um perigo para a sociedade por não ser bandido? Complicado...


Por isso, hoje, estou a favor de uma pena que seja severa mas que possa ser revertida em caso de erro judicial: a prisão perpétua. Esta é muito mais justa porque, além de manter o indivíduo perigoso isolado da sociedade, em caso de erro judical ele ainda vai estar vivo para reconquistar sua liberdade (e, quem sabe, receber as devidas indenizações). Como estamos tratando de humanos, da mesma forma que não confio na recuperação de um invivíduo que comete crimes graves de maneira recorrente, também, acredito que possa haver falha - em qualquer etapa que seja - em um julgamento e que isso possa levar a uma condenação injusta (como já aconteceu diversas vezes nos Estados Unidos). 


Para ser sincero, eu acho que o criminoso habitual já representa um perigo mesmo estando preso (porque ele pode escapar a qualquer momento) mas, ainda assim, acho prudente não termos na pena de morte algo legalizado porque os critérios que poderiam levar à ela, podem variar a depender da percepção momentânea do Júri ou do Juiz (que, como disse, são humanos e falíveis). 


Outro fator já comentado em alguns textos que li e que é importante colocar aqui: acatamos a pena de morte. Achamos que ela vai ajudar para que nos vejamos livres desses criminosos terríveis (e, às vezes, são mesmo). Só que no final das contas, quem é encarregado da execução é o Estado (pelas mãos de alguém, inclusive). Delegamos ao Estado a tarefa de fazer o serviço "sujo" por nós e, no final das contas, dizemos tranquilos que não matamos ninguém, eximindo nessa fala nossa responsabilidade sobre o que o Estado fez anônimo em nosso nome. Loucura, hein?  


E acredito que para resolver uma parte da criminalidade, esse mesmo Estado teria que ser enxugado com a consequente redução na cobrança dos impostos que tanto depenam a população e inibem as empresas de contratar e produzir mais (inibindo, por tabela, o crescimento econômico). Assim, pelo menos uma parte das desigualdades poderia ser reduzida, o que diminuiria a possibilidade de pessoas sem opção de se sustentar entrarem no mundo do crime. Por tabela, uma melhoria do sistema prisional teria que acontecer, permitindo que o preso que ainda fosse sair da cadeia pudesse ter aprendido algum ofício. Deste modo, além de se dar uma nova chance ao ex-presidiário, eliminaría-se a desculpa de seu retorno ao crime por falta de oportunidades. 


Claro que é um pouco de utopia achar que o Estado realmente levaria em consideração estas duas questões, mas seria um caminho. 


Bom, este foi um resumão de como eu penso em relação à questão. Você não precisa concordar em tudo comigo, mas... 
1 - Acho que os criminosos são pessoas inteligentes e que podem assumir um mínimo de responsabilidade sobre o que fazem. Como diriam as mulheres, se "a culpa do estupro é do estuprador", então, a culpa do crime, em geral, deveria ser do criminoso também. 
2 - Sei que a sociedade pode ter um mínimo de responsabilidade sobre o criminoso mas entendo, também, que é muita ingenuidade de nossa parte achar que podemos medir o grau dessa responsabilidade, inclusive, pela possibilidade de termos (se tivermos) alguma noção do passado desse indivíduo. 
3 - Sem perceber, discriminamos os criminosos achando que para uns deve ser observada sua história de vida, como os assaltantes pobres (isso os redimiria). Já, para outros, simplesmente os condenamos (como os chamados feminicidas), mesmo que eles também sejam de origem humilde - como os assaltantes pobres. 
4 - O grau de preocupação/interesse sobre alguma coisa varia de pessoa a pessoa, portanto, a consideração que temos em ajudar pessoas de determinado grupo ou a preferência por determinada profissão cai numa condição similar à do indivíduo que, dentro de seu livre arbítrio, acha mais rentoso sobreviver de uma maneira ilícita (mesmo sabendo do mal que causa) do que ter que passar dez ou quinze anos para conseguir comprar um bem específico (como um carro, por exemplo). 
5 - Ainda não existe uma prova definitiva de que a instituição da pena de morte seja capaz, por si só, de diminuir a quantidade ou a intensidade dos crimes cometidos, portanto, a única coisa que poderia justificar sua instauração seria a satisfação de nosso instinto de vingança. 


Por fim, resta à Justiça julgar e delegar ao criminoso a punição que lhe é devida. Mas é certo que, em virtude da possibilidade de se condenar uma pessoa inocente (imagine o sentimento de terror de uma pessoa que está sendo encaminhada para a execução sabendo que nunca fez nada na vida que justificasse isso), devemos ser radicalmente CONTRA A PENA DE MORTE


Compreende-se o fato de que quando o bandido delinque chegando a matar, ele mesmo faz sua condenação, mas o erro dele não pode justificar a possibilidade do nosso..  Independentemente se estaríamos iguais ao delinquente ou não, é fato que munidos da nossa hipocrisia, nunca assumíríamos a responsabilidade pela condenação equivocada de um inocente a partir de uma lei que nós mesmos quisemos ver instaurada. 


Obrigado por ter lido até aqui e forte abraço. 



Complemento e referências:  


(1) - Esse número é controverso. As fontes não dão muita precisão sobre isso. 
(2) - Não se tem um dado preciso sobre as aplicações da pena na China por ser um país fechado à liberdade de informação. 
(3) - Nos EUA as informações neste sentido são mais abertas que em outros países, além do quê, lá o porte de arma é liberado e  vários estados ainda aplicam a pena de morte.
(4) - Immanuel Kant, filósofo prussiano do século XVIII (1724 - 1804) .


• Constituição Federal - Artigo 180 (sobre a pena de morte)  
• Inciso XLVII do Artigo 5 da Constituição Federal de 1988 

• Wikipedia - Pena de morte 
• Jusbrasil - A legitimidade da pena de morte em xeque  
• Jusbrasil - Argumentos a favor ou contra a pena de morte no Brasil  
• Jusbrasil - Deve-se liberar a pena de morte no Brasil? 
• Datafolha - pesquisa pena de morte 2018, 
• Folha de São Paulo - pesquisa pena de Morte 

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