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  26/02/2017  •  Sociedade  •  9720 hits  •  8 comentários ⇣

A tal da farsa do 13º salário

Por volta de 2010 recebi um e-mail falando sobre a grande mentira que era o 13º salário, aquele dinheirinho que recebemos após 12 meses de trabalho, pago através da CLT e que faz a nossa alegria natalina. O 13º salário é um benefício que foi criado no Governo de João Goulart, em 1962, através da Lei Nº 4.090, e as pessoas se fiam muito nele para resolver suas dívidas de final de ano. 

O e-mail em questão era, na verdade, um hoax (boato de internet). Um hoax daqueles bem incisivos, cheios de detalhes espertos e que se mostrava como a grande descoberta da humanidade a ponto de parecer até meio antipático. O e-mail demonstrava através de um cálculo perspicaz o quanto as empresas nos engrupiam em relação um direito adquirido que, na prática, era apenas uma enganação. Não tinha como não acreditar e não repassar e, então, as pessoas acreditaram, repassaram e eu acabei recebendo. 

A texto era bem feito, tanto que, apesar de não conseguir engolir, eu não tinha como contestar. Depois de anos isso me voltou à cabeça, resolvi pesquisar e entendi o engôdo. O raciocínio é mais ou menos esse:

Nota: a mensagem fazia o cálculo em Euros (€ 700,00 por mês, para ser mais extato), mas vou transformar para R$ 1.000,00 mensalmente, para facilitar o raciocínio. Segue a mensagem abaixo: 


Se você ganha R$ 1.000,00 a cada mês então, ao final do ano (que corresponde à passagem de 12 meses), você terá ganho um total de R$ 12.000,00. O 13º salário corresponde a 1/12 de cada salário que você ganha mensalmente, então, ao término desses mesmos 12 meses, é óbvio, você ganha 1 salário completo a mais (R$ 1.000,00).

Sua remuneração ao final do ano então seria: R$ 12.000,00 + R$ 1.000,00 = R$ 13.000,00. Ou seja, você trabalhou por um período de 12 meses e ganhou por 13 graças à bonificação que recebeu de seu patrão. Mas talvez não seja bem assim, perceba:

Como um mês tem 4 semanas, se dividirmos seu salário mensal (R$ 1.000,00) por 4 temos que, a cada semana, você ganha o equivalente a R$ 250,00. Um ano tem 52 semanas (pode checar no seu calendário), portanto, se multiplicarmos seu salário semanal de R$ 250,00 por 52 temos R$ 13.000. Voilá! Exatamente os valores somados dos 12 meses que você trabalhou mais o 13º salário que sua empresa supostamente lhe pagou. Ou seja, seu montante recebido no final do ano (os R$ 12.000,00 + R$ 1.000,00 = R$ 13.000,00), na verdade, já tinha sido todo pago durante o ano com seu trabalho de 52 semanas. E você ainda achava que seu patrão estava sendo bonzinho lhe pagando um salário a mais. 

Pois é. Mas o que não deixa ninguém perceber o truque desses cálculos, é justamente a manipulação de alguns dados. Um ano, de fato, tem 52 semanas, arredondando. Mais precisamente, dividindo 365 (dias do ano) por 7 (quantidade de dias em 1 semana) temos 52,14 semanas. No entanto, um mês não tem 4 semanas. Ele tem 4,34 semanas, em média (365 / 12 / 7) - o único mês que tem 4 semanas exatas é fevereiro. E é esse arredondamento que faz a diferença no cálculo total. Quando o texto do e-mail diz que um mês tem 4 semanas, então, automaticamente, ele deveria definir um ano como tendo 48 e não 52, pois 4 (semanas) x 12 (meses) = 48 (semanas). 

O salário, assim, é dividido por 4 (para lhe confundir) ao invés de ser dividido por 4,34. Isso quer dizer que você ganha, na verdade, R$ 230,41 por semana (R$ 1.000,00 / 4,34) e não R$ 250,00 (R$ 1.000,00 / 4).  E se multiplicar esse novo valor por 52 terá aproximadamente os R$ 12.000,00. Isso quer dizer que a empresa, de fato, lhe paga um salário a mais a cada ano trabalhado. As 4 semanas que sobram daquele cálculo mentiroso anterior (52 - 48) são justamente as que fazem diferença para lhe enganar. 

Independentemente se o 13º existe de fato ou é só um embuste para deixar o empregado satisfeito e passivo - achando que está sendo valorizado -, a impressão que eu tenho é que o auto-denominado trabalhador tem uma tendência forte a achar que está sempre sendo trapaceado. Em nenhum momento no e-mail que recebi se fala que em cada mês trabalhado pode haver de 8 a 10 dias somados de final de semana, ou que pode haver feriados ou que, nesses 12 meses de trabalho, depois do primeiro ano, em um deles, o trabalhador não trabalha (férias) e ainda recebe 1/3 de salário a mais (trabalha 11 e ganha por 13). Ok, você pode questionar se esses ditos benefícios realmente lhe interessam, mas acredito que para a maior parte das pessoas, sim.

Eu já tive experiências de trabalho com pessoas sendo subordinadas a mim e sei que nem sempre é fácil se lidar com elas, apesar de algumas serem ótimas para se trabalhar. O problema é que outras não são e acham que o patrão (que nasceu tão pessoa quanto elas) é sempre um aproveitador. Como naquele e-mail lá de cima, parece que o trabalhador é uma vítima por ser subordinado, como se ele fosse a única pessoa correta na sociedade - porque trabalha - e o patrão, aquele que lhe dá emprego, fosse um canalha desocupado. É como se o patrão já nascesse patrão e nunca tivesse se empenhado  para juntar dinheiro e "conquistar" a empresa da qual é dono, comprando a estrutura necessária para fazer essa empresa funcionar e assumindo o risco de ter o próprio negócio, pagando impostos e qualquer indenização trabalhista que venha a ser pleiteada depois. 

Quando assinamos contrato com uma empresa qualquer assumimos um acordo em que cada uma das partes é beneficiada da forma que lhe interessa. Contraímos uma responsabilidade com a empresa e ela conosco, ao mesmo tempo que aceitamos suas condições e ela, a nossa (caso tenhamos algum poder de barganha). Quando ela (a empresa) paga um salário de R$ 1.000,00, este é o salário que aceitamos receber por mês, Independentemente de quantas semanas tenha o ano (se 48 ou 52). Deduzimos que o 13º é um engôdo porque já trabalhamos no ano para ganhar esse dinheiro. Mas se ganhássemos o 14º, como acontecia com os deputados, aí sim seria justo? Nesse caso, no final do ano, receberíamos um salário a mais, de verdade, perfazendo um total de R$ 14.000,00. E se ao invés de ganharmos bônus (como o 13° e o 14°), simplesmente tivéssemos o salário majorado para R$ 2.000,00 (o dobro), aí então acharíamos justo? Nesse caso, receberíamos R$ 24.000,00 por ano mas continuaríamos dizendo que somos explorados porque não recebemos o 13º. E o mesmo aconteceria se recebêssemos R$ 5.000,00 para o mesmo trabalho. No final das contas, por mais que você recebesse, sempre iria querer receber mais, portanto seu salário lhe pareceria sempre injusto - mesmo que esse valor a mais por mês cobrisse folgadamente o tal do 13º salário que você receberia no final do ano se ganhasse menos, como no primeiro exemplo. 

Não estou defendendo empresas mas, de fato, quem merece ganhar mais é seu patrão.
1 - Porque foi ele quem criou a empresa.
2 - Porque o risco sobre a empresa quem assume é ele e não você, o empregado. 
3 - Porque ele precisa ter capital para investir. Isso é subjetivo, mas quanto mais a empresa cresce, mais pessoas são contratadas e mais você pode subir.

É sempre bom a gente ter em mente que ninguém é santo na relação patrão x empregado justamente porque são seres humanos, e de um humano a gente pode esperar qualquer coisa, esteja ele por baixo ou por cima. Mas isso não quer dizer que humanos sejam maus. O comportamento das pessoas pode variar a depender da circunstância, mas não porque, necessariamente, estejam em situações econômicas diferentes (as pessoas têm o seu perfil Independentemente da classe social), sendo assim, ser chefe não significa ser ruim e ser empregado não significa ser bom. Isso sugere que seu patrão pode não ser uma pessoa inevitavelmente ruim e que esteja sempre pensando em lhe passar a perna.

Na verdade, ele fundou a empresa para ganhar mais dinheiro do que ganhava como empregado e isso é um direito que assiste a ele tanto quanto assiste a você. A diferença é que ele conseguiu economizar (porque ganhava mais que você ou porque se sacrificou mais), investiu e montou seu negócio mesmo sem ter certeza de que iria vingar e isso não tem nenhuma relação com caráter. Você também pode se arriscar a montar sua empresa e melhorar de vida, porém, isso exigiria um sacrifício seu para economizar e uma coragem para criar algo que você não sabe se vai dar certo ou se vai falir levando embora todo aquele dinheiro que foi poupado.

Tudo bem, o seu custo anual para a empresa já pode incluir os 13 salários do período, assim sendo, seu patrão diminui seu salário mensal em 1/12, junta os pedacinhos e compõe seu 13º. Mas, provavelmente, todas as empresas fazem a mesma coisa, então não tem como escapar. 

Nesse caso, melhorar de vida pode implicar em tentar alguma das opções abaixo:
1 - Protestar por melhores salários.
2 - Estudar mais para ser mais valorizado em seu trabalho.
3 - Mudar de empresa.
4 - Mudar de região (cidade, estado ou país).
5 - Ser autônomo.
6 - Criar sua empresa e virar patrão.

Para quem considera sempre os patrões verdadeiros "sem-caráter", a última opção é justamente a mais questionável pois, se o fato de ser dono de negócio, por si só, já define mau-caratismo, então, você mesmo se repreenderia e se rejeitaria. Da mesma forma que você provavelmente rejeita todos os seus amigos e parentes que são donos de alguma empresa qualquer por achar que eles não têm caráter.

Vale lembrar que é justamente a especialização do trabalho que proporciona certas facilidades como o acesso a uma tecnologia melhor e a bens de consumo mais baratos, como o computador ou smartphone através do qual você está lendo este artigo agora, e essa especialização é quem determina que existam empregados e patrões e toda a hierarquia que se encontra dentro de uma empresa. Caso não existisse a divisão do trabalho, você estaria simplesmente criando e construindo tudo o que utiliza. E é claro, isso seria impossível, pois você teria que ter um tempo imensurável para estudar e ter conhecimento sobre todas as áreas e ainda desenvolver maquinário e métodos para produzir todos os seus bens. 

Portanto, é bom ter a noção de que, por mais que as empresas não paguem o salário que a gente espera, vamos sempre depender das que empregam a gente e das que produzem nossos bens, pois estamos inseridos num sistema que não fazemos a menor questão de rejeitar - reclamamos da empresa em que trabalhamos, mas ficamos loucos para trabalhar quando estamos desempregados, para, em seguida, reclamar da empresa em que trabalhamos. E ser empregado ou patrão é uma questão de circunstância. Ninguém é melhor ou pior por isso. Tem empregados, inclusive, que adorariam estar no lugar do patrão para poder ganhar seu salário mas sem precisar assumir as responsabilidades que ele assume. E no final das contas, se o seu chefe não lhe paga tudo o que você acha justo, é porque, também, existe o Governo no meio dessa história. Esse (o Governo) é quem obriga a empresa a pagar os impostos que fazem com que você custe o dobro para ela (o que faz diminuir seu salário), para depois, lhe devolver esses impostos em forma de educação pública questionável, saúde pública de baixa qualidade, estradas que não levam a lugar algum, pontes que caem, estádios inúteis e serviços públicos deficientes. O seu verdadeiro inimigo pode ser aquele que não lhe paga 13º nenhum, que leva 5 meses de seu trabalho em tributos e que ainda vai pedir seu voto nas próximas eleições.


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Marcio Carneiro | 11/01/2019 | Comentário 1
Considerando um salário de R$ 1.000,00 por mes, por um ano de 12 meses mais um 13º salário.

O salário semanal com mes de 4 semanas é de R$ 1.000,00 / 4 = R$ 250,00 e salário de 250 * 52 = R$ 13.000,00 para ano com 52 semanas.
Um salário mensal de R$ 1.000,00 por um Ano de 12 meses mais o 13º salário: 1000 x 12 + 1000 = R$ 13.000,00, ou seja, em um ano com 52 semanas o salário semanal é igual ao ano com 13 salários: um ano de 12 meses tem salário menor que um ano de 52 semanas, mas é o mesmo ano.

Um ano com 365 dias tem 52,1429 semanas e um mes tem 4,3452 semanas e um salário semanal de R$ 230,14 e salário anual de 230,14 * 52,1429 = R$ 12.000,17.
Um ano com 366 dias tem 52,2857 semanas e um mes tem 4,3571 semanas e um salário semanal de R$ 229,51 e salário anual de 229,51 * 52 = R$ 11.934,52.

Como se pode ver pela aritmética, um ano de 12 meses e 52 semanas deveria ter o MESMO SALÁRIO, ou seja, um ano de 52 semanas paga o mesmo que um ano de 13 meses (12 meses + o 13º salário).

salário = 1.000,00
meses = 12
13º = 1.000,00
total/ano = 13.000,00

semanas c/365 dias = 52,1429
semanas c/366 dias = 52,2857
semanas/mes c/365 dias = 4,3452
semanas/mes c/366 dias = 4,3571

salário semanal c/365 dias = 1000/52,1429 = 19.1781
salário semanal c/366 dias = 1000/52,2857 = 19.1257
sal/semanal c/4semanas = 1000/4 = 250,00
sal/semanal c/4.3452 semanas = 1000/4,3452=230,14
sal/semanal c/4.3571 semanas = 1000/4,3571=229,51

ano com 365 dias
sal/ano/sem/c/4,3452 = 11.967,28
+ 13º = 12.967,28

ano com 366 dias
sal/ano/sem/c/4,3571 = 11.934,52
+ 13º = 12.934,52


Creio que todo o problema do 13º salário se baseia na definição legal de ano de trabalho, salário mensal e de 13º salário.
1 |  João Taboada | 02/03/2019
Marcio, talvez você tenha se prendido muito à questão dos dias. No Brasil, o salário é um acordo mensal, independentemente se o trabalhador trabalha todos os dias ou se deixa de trabalhar nos finais de semana e feriados, além das férias.
Um abraço e obrigado.

André | 11/01/2019 | Comentário 2
Muito bom. Também desconfiava disso, mas nunca fiz contas. E muito bom também a visão patrão/empregado.
1 |  João Taboada | 02/03/2019
Valeu, André. Aquele abraço.

jorgealferreira@gmail.com | 07/10/2018 | Comentário 3
Também já havia recebido mensagem como o e-mail recebido por você e não aceitava o cálculo ali explicitado.Muito obrigado pelo esclarecimento.
1 |  João Taboada | 27/11/2018
Obrigado, Jorge. Espero que tenha ajudado.

Laércio | 01/10/2018 | Comentário 4
Parabéns e obrigado pelo artigo 13°salario. Já fui questionado sobre isso e fiz o mesmo cálculo seu. Como ninguém concordou, achei que sou louco. Obrigado, obrigado, obrigado!!!!
1 |  João Taboada | 02/10/2018
Legal que tenha sido útil. Obrigado, Laércio, e um grande abraço.

      
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